A lista
que salvou meu casamento
O dia finalmente chegou. Eu insisti o quanto pude para manter
meu casamento.
Assim que Bill, meu marido, saiu para o
trabalho, fiz uma única mala para mim e meu filho de 14 meses e abandonei nosso
lar. Este era o único ano em nosso casamento que vivíamos na mesma cidade que
meus pais. Obviamente, a conveniência de poder
correr para os braços de papai e mamãe tornou a decisão de deixar Bill mais
fácil.
Foi com um rosto enraivecido e molhado
de lágrimas que entrei na cozinha de minha mãe. Ela
pegou o bebê enquanto eu, entre soluços, fazia minha declaração de
independência.
Depois de lavar o rosto e tomar uma
xícara de café, mamãe me disse que papai e ela me ajudariam. Era reconfortante saber que eles
estariam ali para me apoiar.
– Mas, antes que deixe Bill
definitivamente – ela disse – tenho uma tarefa para você.
Minha mãe colocou o bebê adormecido na
cama e, pegando uma folha de papel e uma caneta, traçou uma linha vertical
dividindo a folha ao meio. Ela
me explicou que eu deveria escrever na coluna da esquerda uma lista de todas as
coisas que Bill havia feito e que tornavam impossível a convivência com ele.
Conforme observava a linha divisória,
imaginei então, que ela me pediria para relacionar as boas qualidades de Bill
na coluna da direita. “Vai ser fácil” pensei. Imediatamente a caneta começou a
deslizar sobre o papel, e rapidamente cheguei ao final do lado esquerdo.
Para começar, Bill nunca juntava as
roupas que ele deixava pelo chão. Nunca
me avisava quando ia sair. Dormia
durante os cultos. Tinha hábitos deselegantes e
embaraçosos, como por exemplo, assoar o nariz ou arrotar à mesa. Nunca me comprava bons presentes. Recusava-se a combinar as roupas, era
rigoroso com gastos e não me ajudava com as tarefas domésticas. Também não gostava de conversar comigo. E a lista continuava até encher toda a
folha.
Certamente eu tinha evidências mais do
que suficientes para provar que nenhuma mulher seria capaz de viver com este
homem. Declarei pretensiosamente, logo que
terminei:
– Agora sei que você vai me pedir para
escrever as boas qualidades de Bill do lado direito.
– Não – ela respondeu – Eu já conheço
as qualidades de Bill. Em
vez disso, gostaria que, para cada item do lado esquerdo, escrevesse qual foi a
sua reação e o que você fez.
Bem, isto já seria mais difícil. Eu já havia pensado nas poucas
qualidades de Bill que poderia mencionar. Porém,
em nenhum momento considerei pensar sobre mim mesma. Eu tinha certeza que mamãe não me
permitiria deixar a tarefa incompleta. Então,
comecei a escrever a segunda coluna.
Em resposta às atitudes dele eu fazia
cara feia, chorava e sentia raiva. Eu
me envergonhava de sua companhia. Eu
me comportava como uma “mártir”. Desejava
ter me casado com outra pessoa. Dava-lhe
o “tratamento silencioso”. Acreditava
que era boa demais para ele. O meu lado da lista parecia não ter fim.
Quando cheguei ao final da página,
mamãe pegou o papel da minha mão e foi até a gaveta do armário. Ela pegou uma tesoura e cortou-o ao
meio no sentido da linha vertical que havia traçado. Pegou a coluna da esquerda, amassou-a e
a jogou no lixo; e voltando-se em minha direção me entregou o lado direito.
– Becky, leve esta lista de volta para
casa com você – ela me disse – Passe o restante do dia refletindo sobre ela. Ore sobre isso. Cuidarei do bebê até o anoitecer. Se fizer o que estou lhe pedindo, e
depois se você sinceramente ainda quiser se separar de Bill, seu pai e eu
estaremos aqui para lhe ajudar.
Encarando
os fatos...
Deixando a bagagem e meu filho na casa
dos meus pais, dirigi de volta para casa. Assim
que sentei no sofá com aquele pedaço de papel na mão, não pude acreditar no que
estava vendo. Mesmo sem uma análise adequada dos
hábitos irritantes de meu marido, a minha lista parecia simplesmente horrível. O que eu podia ver era um verdadeiro
recorde de comportamentos mesquinhos, atitudes vergonhosas e reações
destrutivas. Gastei as horas que se seguiram pedindo a Deus que me perdoasse. Pedi a Deus força, orientação e
sabedoria para as mudanças que agora eu sabia que teriam que ocorrer em mim. À
medida que continuava orando, percebi a maneira ridícula com que estava me
comportando.
Eu lembrava vagamente das transgressões
que tinha escrito para Bill. Era uma lista completamente absurda. Não havia nada de tão horrível ou imoral
nela. Na verdade, eu havia sido abençoada com
um bom homem – não um homem perfeito, mas um bom homem. Meus pensamentos recuaram até cinco
anos atrás.
Eu havia feito um voto a Bill. Eu o amaria e o honraria na saúde ou na
doença. Estaria com ele para o melhor e para o
pior. Eu havia dito essas palavras na
presença de Deus, da minha família e dos nossos amigos.
E hoje, pela manhã, estava pronta para
abandoná-lo por causa de aborrecimentos triviais. Neste
momento peguei o carro e voltei à casa de meus pais. Eu estava maravilhada de como me sentia
tão diferente de quando havia chegado da primeira vez, de manhã, para encontrar
minha mãe.
Agora me encontrava em paz... Sentia-me
agradecida e aliviada.
Quando peguei meu filho de volta,
senti-me alarmada ao pensar em como estava prestes a fazer uma mudança tão
drástica em minha vida. Meu
egoísmo quase custara a essa criança a oportunidade de conviver todos os dias
com um pai maravilhoso. Agradeci
a minha mãe, e rapidamente saí porta afora, de volta para minha casa. No horário em que Bill costumava chegar
do trabalho, eu já havia desfeito a mala e esperava por ele.
Um
novo olhar...
Eu adoraria poder dizer que Bill mudou. Mas isso não aconteceu. Ele ainda faz as mesmas coisas que “me
aborrecem, me envergonham e me deixam a ponto de explodir”.
Na verdade, a mudança aconteceu comigo!
Daquele dia em diante, me tornei
responsável não apenas por minhas ações em nosso casamento, mas também por
minhas reações. Ainda me recordo de um item da lista:
Bill dormia durante os cultos. O
momento em que ele começava a cochilar sempre marcava o fim do meu período de
adoração. Eu acreditava que ele, de propósito,
não tinha o menor interesse na mensagem – e meu pai era o pregador! Eu não me importava com o fato de Bill
não ser capaz de permanecer acordado a qualquer hora por longos períodos. O tempo que ele gastava cabeceando de
tanto sono eu gastava bufando de raiva. Sentia-me
envergonhada no meio da congregação. Era
uma grande humilhação. Tentava
imaginar por qual razão eu havia casado com esse homem. Certamente ele não merecia uma esposa
tão boa quanto eu! Somente agora podia enxergar claramente
como eu era. Meu orgulho estava atrapalhando uma
parte muito importante da minha vida: a minha adoração.
Agora, quando Bill cochilava na igreja,
eu gastava esse momento em oração e agradecimento. Desviava os meus olhos dele dormindo e
de mim mesma, para concentrar o meu olhar apenas em Deus. Em vez de deixar a igreja furiosa,
passei a sair cheia de alegria. Não
demorou muito até que Bill percebesse a diferença. Ele comentou durante um almoço de
domingo: “Você parece estar gostando mais dos cultos ultimamente. Eu já estava começando a pensar que
você não gostava do pregador”. Meu instinto imediato seria contar-lhe como ele
havia arruinado tantos cultos que assisti... Mas,
ao contrário, aceitei seu comentário sem erguer minhas defesas.
Refazendo
a lista...
Tenho refeito essa lista muitas vezes
ao longo dos anos. Continuo pedindo perdão a Deus pelo meu
comportamento patético e sabedoria para vivenciar o meu casamento. Quinze anos depois desta experiência,
Bill, aos 49 anos, foi diagnosticado como portador do Mal de Alzheimer. Ele teve que abrir mão de seu trabalho
como professor, e assumi o sustento da família, o que nos levou a dias de
muitas tentativas e noites de muita preocupação. Observá-lo
lutando para manter suas habilidades básicas diárias tem sido uma grande
inspiração tanto para mim quanto para nossos filhos.
Precisamos depender de nossa fé para
crer que Deus está no controle – especialmente quando sentimos não ter controle
algum da situação.
Temos procurado na Bíblia as respostas
para estas questões difíceis de entender. Gastamos
nosso tempo com emoções que vão desde a raiva até a tristeza. Perguntamos-nos,
“Por quê?”. Nesses momentos, clamamos a Deus e
pedimos que nos dê a paz que excede a todo entendimento.
Lamentavelmente, existem dias em que
minha paciência está quase esgotada mesmo sabendo que Bill não pode evitar
certas coisas que me irritam. Então,
percebo a minha responsabilidade em reagir com o amor que Deus tem me mostrado. Clamo a Deus e peço que ele ame Bill
através de mim – porque sei que não sou capaz de amar Bill da maneira que Deus
o ama.
Agradeci a Deus muitas vezes por ter
uma mãe que foi minha mentora espiritual. Embora
tenha certeza de que se sentiu tentada a fazê-lo, naquele dia mamãe não me
passou um sermão ou me deu sua opinião sobre o meu comportamento. O que ela fez foi conduzir-me a
descobrir a verdade que salvou o meu mais precioso bem: meu casamento. Se não tivesse aprendido a reagir como
uma esposa cristã aos pequenos problemas de Bill, eu jamais seria capaz de
reagir de maneira adequada aos grandes problemas que hoje enfrentamos.
Ao chegar em casa outro dia, meu filho
me perguntou o seguinte:
– Mãe, o que vamos fazer quando papai
não se lembrar mais de nós?
– Bom, nós vamos nos lembrar de quem
ele é. Lembraremos do pai e do marido que ele
foi. Vamos nos lembrar de tudo que ele nos
ensinou e da maneira maravilhosa com que ele nos amava – Respondi.
Depois que meu filho saiu da sala,
fiquei pensando neste homem que amou sua família e o seu Deus.
Sorri comigo mesma: muitas das minhas
lembranças mais vívidas eram daqueles pequenos hábitos irritantes que me
levaram a fazer uma lista de defeitos anos atrás.